Ministério do Meio Ambiente realiza ações de revitalização na bacia do São Francisco, mas entidades da sociedade civil querem mais participação nas decisões e pedem que causas centrais da degradação do rio sejam atacadas.

SÃO PAULO –O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do governo federal garantiu cerca de R$ 1,6 bilhão em ações de revitalização de bacias hidrográficas. Desse montante, o rio São Francisco conta com R$ 270 milhões anuais para sua recuperação. A verba ajuda a garantir a série de medidas e iniciativas que o Ministério do Meio Ambiente (MMA) tem se preocupado em implantar nos últimos meses em parceria com outros 14 ministérios, que incluem o da Integração e o da Cultura.

“As ações estruturantes são as que estão sendo priorizadas no momento”, explica Maurício Laxe, coordenador do Programa de Revitalização da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco do MMA. Segundo ele, essas ações incluem frentes que promovem o reflorestamento, a educação ambiental das populações da bacia, o fomento ao turismo sustentável, a dessalinização, a implantação de cisternas e os projetos para reforma agrária e para atividade agrícola, pesqueira e siderúrgica.

As obras de infra-estrutura são um dos principais focos da revitalização, o que inclui saneamento básico e ambiental, tratamento de resíduos sólidos e controle de processos erosivos. Elas serão feitas em parceria com a Companhia para o Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e Parnaíba (Codevasf) e o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama).

O coordenador do programa afirma que foi priorizado o sistema de saneamento básico de 100 municípios, que se encontram na calha principal do rio, além de outros 39 que estão nas duas principais sub-bacias do São Francisco, a de Paraopebas e do rio das Velhas.

A bacia hidrográfica São Francisco tem um 504 municípios (9% do total do País) e cerca de 16 milhões de pessoas (9,5% da população do país). “O maior foco de poluição está na região de Minas Gerais e é onde um terço da população do São Francisco vive, por isso estamos fazendo uma parceria com o governo do Estado de Minas Gerais”, explica Laxe.

É nesse âmbito que o Programa privilegia a descentralização de ações para que os Estados e municípios também assumam sua parcela de responsabilidade no processo do Velho Chico. “É importante ter ações conjuntas; é o que chamamos de gestão compartilhada. O programa tem que ter caráter nacional”, avalia o coordenador.

A revitalização do São Francisco é um processo previsto para durar ao longo dos próximos 20 anos e está previsto um custo total de R$ 9 bilhões. Desde 2004, foram gastos pouco mais de R$ 250 milhões. “É um trabalho de uma geração”, define Laxe.

Críticas da sociedade civil
Apesar de o processo de revitalização ser pauta de entidades da sociedade civil, muitas fazem críticas ao que está sendo feito. “Na verdade, o que a gente tem visto acontecendo ao longo da bacia são projetos pontuais: algumas milhares de mudas sendo produzidas, uma ou outra cidade com projeto de saneamento. Não existe um processo que pense em conjunto a bacia. Queremos discutir com o governo todo o projeto de revitalização, não questões isoladas, e atacar as causas que degradam o São Francisco”, diz Cícero Feliz dos Santos, da equipe do projeto Articulação Popular do São Francisco, coordenada pela Comissão Pastoral da Terra (CPT).

Segundo Luis Cláudio Mandela, assessor da Cáritas Brasileira, grande parte das ações são pautadas em atividades relacionadas ao plantio de mudas, cujos resultados são duvidosos. Na mesma linha, Santos avalia que “não é o plantio de árvores que resolverá o problema do São Francisco”.

“Uma questão séria é a derrubada da caatinga e do cerrado, este último sendo transformado em carvão. O cerrado é a caixa de água do São Francisco e estão fazendo dele grandes monoculturas. O governo precisa fazer com que as ações que estão sendo desenvolvidas sejam transformadas em políticas públicas para viabilizar abastecimento de água e produção sustentável. Isso é repensar esse modelo de desenvolvimento ecologicamente insustentável e socialmente injusto. O grande projeto seria de fato transformar a convivência com semi-árido em política pública”, explica Santos.

Um dos objetivos do programa é ampliar o número de Unidades de Conservação (UCs) da região da bacia, que conta com apenas 1% de áreas protegidas. De acordo com o planejamento, seriam mais 21 novas UCs, as quais seriam responsáveis por formar um corredor ecológico para a proteção das principais nascentes e lagos marginais.

O MMA destaca que o processo conta com participação tanto dos representantes governamentais, como os da sociedade civil e da iniciativa privada, por meio do Fórum de Articulação Interinstitucional, mas as entidades afirmam que nem sempre são ouvidas. “Na grande maioria das vezes as ações são feitas sem o processo de participação da sociedade”, afirma Santos. Qualquer ação de revitalização tem que partir de uma ação de mobilização da população do seu entorno e isso a gente não tem visto nas ações do governo”, observa Mandela.

Transposição e revitalização
“O processo de revitalização não tem como causa ou conseqüência o processo de transposição do rio”, afirma Mauricio Laxe, coordenador do programa de revitalização do São Francisco. Segundo ele, a revitalização do rio está sendo feita porque ele é o mais degradado do país e o projeto faz parte de um conjunto de ações de recuperação das bacias do país.

Por esse motivo, o coordenador do MMA afirma que as ações de uma obra não condicionam as da outra. “A transposição é uma obra como qualquer outra do São Francisco para tomada de água, é uma intervenção a mais, como o projeto de irrigação Jaíba ou a represa de Sobradinho. A revitalização é uma realidade socioambiental iminente. São duas coisas que seguem paralelas, duas questões separadas”, explica Laxe.

As entidades da sociedade civil entendem os dois processos de outra forma: “O que avaliamos é que projeto que o governo tem colocado são paliativos para fazer passar o projeto de transposição. Queremos uma discussão ampla entre sociedade e governo para discutir real situação do rio e iniciativas que podem dar conta disso, garantindo água para populações do semi-árido. Há outras iniciativas, outras obras que podem resolver problemática da água sem que seja necessário fazer a transposição”, afirma Cícero Felix dos Santos, da Articulação Popular do São Francisco.

(*) Colaborou Jonas Valente